As linhas gerais que orientam a execução da política
externa desde 2003 até o afastamento da Presidenta Dilma foram estabelecidas no
início da década de 1960, quando a diplomacia brasileira inaugurou a Política
Externa Independente pretendendo instrumentalizar o desenvolvimento econômico a
partir dos princípios nacionais. Esses mesmos princípios, mesmo que de forma
tímida, foram recuperados na segunda metade dos anos 1970, quando então se desempenhou
uma política em busca de mercados externos, independente de parcerias políticas
multi ou bilaterais, denominada de Pragmatismo Ecumênico Responsável, e
balizaram a política externa do país até o fim dos anos 1980. Nos anos 1990, o
nacionalismo e a independência guiaram apenas o breve governo do presidente
Itamar Franco, ocasião em que o chanceler Celso Amorim esforçou-se para
reintroduzir o conceito de desenvolvimento na agenda internacional, no entanto,
durou até o governo Fernando Henrique Cardozo que introduziu pensamento
“liberal cosmopolita” na política externa brasileira, durando ao longo de toda
a década de 1990.
A política com a prevalência do pensamento liberal
ou Estado normal, como denominou Amada Cervo e Clodoaldo Bueno no livro História da Política Exterior do Brasil,
durante o período do ex-presidente Fernando Henrique Cardozo (FHC), “seguiu três
parâmetros de conduta: como o Estado subserviente, submete-se às coerções do
centro hegemônico do capitalismo; como o Estado destrutivo, dissolve e aliena o
núcleo central robusto da economia nacional e transfere renda ao exterior; como
o Estado regressivo, reserva para a nação as funções da infância social”
(CERVO; BUENO, 2002, p. 457)[1]. Seguindo
estes parâmetros, o governo FHC privatizou a Companhia Vale do Rio Doce, em
1997, então a maior exportadora de minério de ferro do mundo. A empresa foi
arrematada por US$ 3,3 bilhões. Quanto aos bancos, o governo, Fernando Henrique
Cardozo forneceu pacotes como: o Programa
de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária
(PROES) e o Programa de Estímulo à
Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (PROER)
para sanear os bancos, deixando rentáveis. Após esses programas, iniciaram as privatizações dos bancos BANERJ e o BANESPA,
como também as estatais ferroviárias e Centrais Elétricas Brasileiras
(Eletrobrás) e a outras estatais, como a Cemig e a Cesp. Outra
característica da política externa “liberal cosmopolita” é a concepção do lugar
do Brasil nas relações internacionais que indicava na direção da melhor relação
possível com os Estados Unidos da América (EUA), a União Europeia (EU) e o
Japão, seguindo a agenda internacional, lucrativa e pacifica. Um exemplo de “submissão”
a agenda internacional foi a assinatura do Tratado de Não Proliferação Nuclear,
em 1998, além de aceitar, mas não assinar, o projeto norte-americano da criação
da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), consumando a hegemonia dos EUA
no continente.
Outra perspectiva é o pensamento
nacional-desenvolvimentista na política externa que considera que a lógica das
relações internacionais continua sendo política-estratégica, bem como entende
que o sentido da inserção brasileira no sistema mundial de poder é a luta pelo
desenvolvimento. Neste sentido, a agenda é romper com os bloqueios impostos
pelas potências que modelaram a ordem internacional segundo seus próprios
interesses, para continuar em sua trajetória ascendente em direção a patamares
mais elevados de desenvolvimento econômico-social. No entanto, para sustentar
está política externa nacionalista, o Brasil, buscou na política sul-sul e nos
BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) aliados, mas que
configurou como sócios, que contribuíssem com o equilíbrio de poder nas
relações internacionais. Portanto, dentro deste pensamento nacional-desenvolvimentista
é possível destacar uma política comprometida com a promoção do desenvolvimento
do país, com a busca da autonomia decisória e com a luta para tornar a ordem
internacional menos desconfortável para os países em desenvolvimento.
No entanto, o governo Dilma, a partir,
principalmente, do seu segundo mandato, vem sofrendo com a instabilidade
política e econômica, financiada pela pressão de uma parte da sociedade, das
grandes mídias e das potências internacionais, acarretando em um agravamento na
governabilidade da Presidenta Dilma Rousseff. Com a falta de governabilidade, o
pedido de impeachment da Presidenta é deferido pelo presidente da Câmara dos Deputados,
Eduardo Cunha réu no Supremo Tribunal Federal (STF), sendo aprovado pela grande
maioria dos deputados. Após a aprovação na Câmara dos Deputados o processo foi
encaminhado para o Senado Federal onde também foi aprovado. Com o afastamento
da Presidenta Dilma, o vice-presidente Michel Temer assume, provisoriamente, a
República Federativa do Brasil e apresenta um plano de governo intitulado: “Ponte Para o Futuro”. Dentro deste plano
se insere a política externa que tem como objetivo: “realizar a inserção plena
da economia brasileira no comércio internacional, com maior abertura comercial
e busca de acordos regionais de comércio em todas as áreas econômicas
relevantes – Estados Unidos, União Europeia e Ásia – com ou sem a companhia do
Mercosul, embora preferencialmente com eles”[2].
Com a nomeação do senador José Serra na pasta do
Ministério das Relações Exteriores, no governo provisório do vice-presidente
Michel Temer, o plano “Ponte Para o
Futuro”, no que tange as relações internacionais, teve seu primeiro impacto
na União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e governos da Venezuela, Cuba,
Equador e Nicarágua após o pronunciamento do então chanceler que por meio de
nota oficial do Itamaraty disse que os governos citados acima e a Unasul
estariam propagando falsidades sobre o processo político interno do Brasil[3].
Está nota fez com que o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciasse,
durante a reunião do Conselho de Ministros, o retorno a Caracas do embaixador
venezuelano no Brasil, Alberto Castellar. Com isso, inaugura-se uma nova
política externa brasileira que rompe com alguns pontos do legado deixado pelo
Barão do Rio Branco que durante sua passagem e fundação do Itamaraty manteve,
sempre, uma política de negociação e respeito aos governos vizinhos que
estivessem embasados em suas constituições com a prática do “multilateralismo”.
Além disso, há um retorno da política unilateral, que foi rechaçada e
denunciada pela grande maioria dos embaixadores brasileiros durante o governo
Fernando Henrique Cardozo, que transformou o Ministério das Relações Exteriores
em um balcão de negócios a serviço do centro, ou seja, das grandes potências
internacionais. Portanto, a discussão que gira em torno do atual cenário é a
volta de uma política externa de submissão à agenda internacional introduzida
pelo centro e acatamento da periferia.
[1] CERVO, Amado Luiz; BUENO,
Clodoaldo. História da Política Exterior
do Brasil. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2002.
[2] Ponte Para o Futuro, 2015, p.
18. Disponível em: < http://pmdb.org.br/wp-content/uploads/2015/10/RELEASE-TEMER_A4-28.10.15-Online.pdf> acesso: 15 de maio de 2016.
[3] Disponível em: < http://www.valor.com.br/politica/4563015/itamaraty-brasil-rejeita-manifestacoes-que-propagam-%3Ffalsidades> acesso: 15 de maio de 2016.
Colunista Henrique Barros
Acadêmico de Relações Internacionais da
Universidade do Vale do Itajaí (Univali) – Campus Balneário Camboriú.
1ª Vice-Presidente da União Catarinense das e dos Estudantes.
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